Dentre as mudanças trazidas pela Reforma Trabalhista, a nova redação do artigo 457, da Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”), referente à remuneração, é um ponto ainda a ser explorado e que tende a ser pacificado com o posicionamento da jurisprudência.
Até a Reforma Trabalhista, tinha-se que a remuneração do empregado, sob o viés trabalhista, era composta pelo salário mensal fixo e também pelas demais gratificações ajustadas, uma vez que pagas em contraprestação aos serviços prestados.
Nesse sentido, a jurisprudência definiu, antes da Reforma Trabalhista, como gratificação ajustada os valores contratualmente acordados e aqueles pagos habitualmente, tais como bônus anuais previamente acordados e pagos de forma recorrente. Dessa forma, as gratificações ajustadas, pagas nessas condições, compunha a remuneração dos empregados, e, como tal, integrava a base de cálculo de encargos trabalhistas e previdenciários.
Por outro lado, sempre foi entendimento jurisprudencial e doutrinário que, somente os valores pagos em parcela única, de forma não habitual e não ajustados, não integrariam a remuneração, por não serem considerados como gratificações ajustadas, tratando-se, na verdade, de meros ganhos eventuais.
Já em relação ao prêmio, segundo Vólia Bonfim, “os prêmios têm a finalidade de recompensar, estimular, agradar, presentear o empregado. É instituído em caráter de liberalidade para uma situação especial, não obrigando o empregador a repeti-lo ‘ad futurum’, salvo ajuste em contrário.”
Ainda, “o prêmio costuma consistir na promessa de vantagem, em dinheiro ou não, caso certo empregado ou grupo de empregados atinja certo nível de produção ou observe determinada conduta, tais como pontualidade ou constância no comparecimento”. (Russomano, Curso, p. 371)
Ainda que tais conceitos se assemelhem, Arnaldo Süssekind, em sua obra Instituições do Direito do Trabalho, distinguia as gratificações dos prêmios, afirmando que, enquanto gratificações se destinavam ao melhor rendimento e comportamento do empregado, sendo fixadas de forma generalizada, coletiva, sem levar em conta os atributos individuais de cada um, os prêmios eram fixados para compensar atributos pessoais do empregado, sendo que seu pagamento dependia apenas da ação pessoal do empregado.
Ocorre que, com a Reforma Trabalhista, o conceito amplo de salário foi revisitado a partir da alteração da redação do artigo 457, e, dentre as mudanças trazidas, está a eliminação do termo “gratificação ajustada” e a inclusão do § 2º, que determina que não integram a remuneração para fins trabalhistas e previdenciários as importâncias, ainda que habituais, pagas a título de prêmios, assim entendidos como “as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades”, conforme § 4º.
Houve, portanto, uma alteração conceitual, de modo que gratificação passou a ser a parcela destinada a agradar, estimular ou compensar a maior responsabilidade, da função, cargo, ou desempenho, enquanto que o prêmio assumiu a finalidade de prestigiar o excepcional desempenho do empregado, assim considerado o acima do ordinariamente esperado.
Com isso, valores pagos pelo empregador, por mera liberalidade, de forma espontânea e inesperada, “em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado”, não integram a remuneração para fins trabalhistas e previdenciários.
Tais alterações abriram precedentes para que fosse questionada a abrangência do conceito de prêmio implementado pela Reforma Trabalhista: estaria sendo elastecida a sua definição original, para também incluir bônus anuais pagos pelas empresas, que, se assim entendidos, deixariam de integrar a remuneração dos empregados para fins do cômputo de encargos trabalhistas e previdenciários?
Percebe-se do texto do artigo que o conceito de “liberalidade” e a expressão “em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado” não são, em seu todo, determinações exatas, o que permite interpretações e aplicações diversas, inclusive do que seria liberalidade, a fim de qualificar determinado pagamento como prêmio.
A princípio, considera-se liberalidade tudo que é concedido pela empresa, mas não exigido pela legislação aplicável, no entanto, não ficou claro se para ser considerado liberalidade é necessário que não tenha sido contratualmente acordado.
Entendemos que o prêmio pago por mera liberalidade não poderia ser equiparado ao pagamento ajustado contratualmente, pois necessária a imprevisibilidade do pagamento para enquadrá-lo no novo conceito de prêmio, trazido pela Reforma.
O prêmio pago por mera liberalidade, portanto, se aproxima mais do conceito de gratificação eventual e não ajustada, que, mesmo antes da Reforma Trabalhista, já não integrava a remuneração para fins trabalhistas e previdenciários. Por outro lado, o pagamento contratualmente acordado se aproximaria do conceito de gratificação ajustada, que, até então, integrava a remuneração.
Percebe-se que a Reforma Trabalhista inova ao esclarecer que os prêmios pagos por mera liberalidade, ainda que habituais, não integram o salário, em sentido contrário ao entendimento jurisprudencial anterior à Reforma, que determinava que a habitualidade implicava em ajuste tácito, muito provavelmente por gerar expectativas.
É possível que prevaleça, nas esferas administrativa e judicial, o entendimento de que somente será considerado prêmio o pagamento que não tenha sido previamente acordado, dependendo do fator “surpresa”, em que o empregador remunere o empregado pela superação de metas previamente estabelecidas.
De toda forma, seria possível sustentar que a qualificação de um pagamento como prêmio deve ser feita considerando-se as características de cada caso para determinar se o pagamento estaria ou não remunerando o desempenho superior ao ordinariamente esperado.
Frente a tal cenário e, ainda pendente de muitas discussões sobre os impactos da Reforma Trabalhista, a nosso ver as gratificações, tais como os bônus anuais contratualmente acordados, deverão continuar sendo considerados como parte da remuneração dos empregados e, portanto, integrados à base de cálculo de encargos trabalhistas e previdenciários.